#6 Vesperata: A IDENTIDADE MUSICAL DE DIAMANTINA COMO PATRIMÔNIO MUNDIAL DA UNESCO

Tradução: Ânderson Arcanjo

 

Após o encontro da semana passada com o músico e pesquisador Wander Conceição, o Wander gentilmente se ofereceu para nos encontrarmos para uma segunda sessão, a fim de continuarmos nossa conversa sobre o desenvolvimento histórico do patrimônio musical de Diamantina. 

 

Na última sessão, o Wander me levou a um panorama de como Diamantina contribuiu para o desenvolvimento da música brasileira (principalmente  a música barroca e a Bossa Nova) desde o século XVIII. 

 

Partindo desse contexto histórico, iniciamos essa sessão falando sobre o impacto do título de Patrimônio Mundial da UNESCO para Diamantina e vice-versa. A cidade de Diamantina foi declarada Patrimônio Cultural da Humanidade pela UNESCO em 1999 e um dos objetivos com essa inscrição era preservar e resgatar a tradição musical diamantinense. Com isso, renasceu uma importante tradição musical - a Vesperata, uma apresentação musical originada com a banda militar que se desenvolveu em Diamantina do final do século XIX ao início do século XX (fotos no vídeo acima). 

 

A Vesperata, hoje realizada aproximadamente 16 vezes por ano durante os meses de abril a outubro, é, sem dúvida, uma identidade única de Diamantina. É um espetáculo em que os músicos tocam nas sacadas da Rua da Quitanda, ao redor do público. Essa estrutura de apresentação, incorporando elementos arquitetônicos do casario, foi um dos aspectos que tentei explorar através na minha peça para a Vesperata este ano. 

 

Então, perguntei ao Wander: para começarmos, como foi que a Vesperata se desenvolveu? 

 

E o Wander me contou o seguinte: 

 

Durante o período do final do século XIX ao início do século XX, havia uma tradição de entretenimento chamada "Retretas". Como ainda não havia eletricidade em Diamantina naquela época (a eletricidade chegou por volta de 1910), a única forma de entretenimento eram os espetáculos ao ar livre, que aconteciam no final da tarde. A banda da Polícia Militar executava uma peça chamada La Mezza Notte (A Meia-Noite) - que se acredita ser de origem italiana. Não se conseguiu identificar quem foi o compositor, mas no manuscrito dessa música aparece a inscrição “O. Callini”. Para executar essa música, que fazia parte das “Retretas”, os músicos da banda militar foram posicionados nas sacadas, e foi assim que se estabeleceu essa estrutura de apresentação. 

 

A partir da década de 1930, novas formas de entretenimento chegaram à cidade: os cinemas, na década de 1930, e os clubes sociais nos anos 1940. Portanto, essa tradição das apresentações da banda militar acabou se perdendo. Na década de 1990, quando decidiu candidatar-se a Patrimônio Mundial da Humanidade pela UNESCO, Diamantina formou um comitê de especialistas locais. A pergunta que fizeram foi: que tradição de Diamantina podemos apresentar para justificar essa candidatura? Diante desse questionamento, Monsenhor Walter Almeida,  sacerdote católico (que também era músico e chegou a participar das Retretas), lembrou a tradição há muito perdida das apresentações da banda militar e sugeriu que ela fosse resgatada. Além disso, ele sugeriu que esse evento fosse chamado de 'Vesperata', uma palavra derivada de 'Vésperas' (termo latino para a oração do início da noite). Esse foi o início da Vesperata. 

 

Com uma palavra original - “Vesperata” - usada exclusivamente para essa tradição musical exclusivamente diamantinense, fica claro que essa tradição musical é uma parte importante da identidade de Diamantina. A Vesperata não só desempenhou um papel significativo na inscrição de Diamantina como Patrimônio Mundial da UNESCO,  mas teve também um impacto social, unindo os diamantinenses e contribuindo com o turismo.  

 

La Mezza Notte 

Como o Wander é coautor do Livro La Mezza Notte – O Lugar Social do Músico Diamantinense e as Origens da Vesperata, fiquei curiosa para saber mais sobre a peça original La Mezza Notte e se ela ainda era executada. Segundo Wander, essa peça foi tocada pela última vez em 2003 e, infelizmente, não há nenhuma gravação. Embora ele já tenha aos organizadores da Vesperata que essa música volte a ser executada, inevitavelmente o programa fica por conta da decisão do comitê organizador e o foco tem sido em peças mais "populares", que atrairiam um público maior. 

 

Pois bem, como musicista ainda nova na Vesperata, eu gostaria de fazer um pedido pessoal aos organizadores, pois tenho certeza que seria interessante para muitos de nós ouvirmos essa peça que estabeleceu a estrutura da Vesperata! Nesse encontro, falamos sobre possibilidades para fazermos essa solicitação. Espero que esse resgate aconteça em um futuro próximo!